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Opinião

Empoderamento de mulheres na TI é necessário?

O crescimento de projetos organizados por ONG's, empresas e governos podem nos levar ao questionamento.

Por Ana Ribeiro,
Autora do Blog Ana ++ e Colunista no InspirAda

O Gap na questão de gênero quando se trata da área de Tecnologia da Informação (TI) e demais STEM (Science, Technology, Engineer and Mathematics ou Ciência, Tecnologia, Engenharia e Matemática) é indiscutível: mulheres são definitivamente a grande minoria nessas áreas, basta procurar qualquer estatística ou colocar a cabeça em qualquer sala ou laboratório de cursos desta área.

O ponto de discussão neste texto não é este, mas sim o crescente número de programas organizados por ONG’s, governos e empresas para empoderar mulheres na STEM e na TI, posso citar alguns caso vocês não conheçam nenhum: Women Who Code, Women Techmakers, Digi Girlz, Technovation Challenge, Grace Hopper Celebration, etc.

Muitas pessoas criticam muitos desses programas por não serem algo definitivo: afinal, com uma semana em alguma reunião escutando mulheres engenheiras as garotas não vão deixar de ter dificuldade no mercado de trabalho.

Além disso, muitos também argumentam que o importante é conscientizar os homens para aceitar e ajudar as mulheres, e não empoderar as mulheres (daí vem programas como o He for She da ONU, etc).

Outro ponto que alguns colocam é que na verdade as mulheres não sofrem preconceito. Afinal, por aqui elas não levam um tiro na cara ao tentar ir para a escola como acontece no Oriente Médio.

Ainda há alguns que falam que estas iniciativas querem dar oportunidades para mulheres que homens não tem. Afinal, passar uma semana ou ter algumas reuniões em um ambiente empoderador não é algo que os homens tenham (haha, como se homens não fossem empoderados todos os dias).

Bem, a maioria desses argumentos são bem fora da realidade, vou falar com a minha visão de mulher na computação que já foi empoderada por alguns desses programas. De fato, acredito que nunca ninguém me impediu de estudar, ninguém nunca colocou uma arma na minha cabeça dizendo que se eu fosse para escola teria os meus miolos estourados.

Não preciso ser a Malala para sofrer de machismo na Academia!!!

Nós mulheres lidamos com o machismo todos os dias, com comentários idiotas advindos de pessoas idiotas, desde as objetificações dos nossos corpos até comentários estilo “Você não deveria ter saído da cozinha”.

Mas, isso não é “luxo” só da mulher nas Hard Sciences, todas as mulheres lidam com isso, não importa se ela estuda filosofia ou computação (o blog Being a Woman in Philosophy fala das besteiras que as mulheres na filosofia escutam).

A Academia é machista, a vida é machista. E não é só mulheres que sofrem preconceito, pessoas negras sofrem, pessoas pobres sofrem. Então por que é importante empoderar especificamente mulheres na TI e nas STEM’s?

Eu queria contar um pouco da minha história para mostrar como isso mudou a minha vida

Quando eu tinha uns 11/12 anos, consegui uma das melhores colocações na Olimpíada Brasileira de Matemática das Escolas Públicas (OBMEP), em consequência fui convidada para participar de um programa chamado PIC (Programa de Iniciação Científica).

Na época foi tudo uma surpresa pra mim, não achava que conseguiria ganhar um negócio desses. Mas, eu fiquei muito feliz e lá fui eu com um caderninho debaixo do braço caminhando para a Universidade para a minha primeira aula do PIC (depois de muita insistência da minha mãe, pois me autossabotava porque não era confiante o suficiente).

Ao chegar senti pela primeira vez o impacto de ser uma garota na STEM: No programa tinham cerca de 20 pessoas e só eu menina!

Confesso que fiquei muito assustada: eu só era uma criança muito tímida que mal tinha coragem de falar com meninos e ainda mais interagir com uma classe inteira só de meninos! Eu fiquei aterrorizada e desisti de participar do PIC na terceira aula.

PIC – OBMEP, primeira oportunidade que perdi por ser garota na STEM e insegura.

Foi a primeira vez que tinha perdido uma oportunidade de estudo e crescimento por ser menina, não porque ninguém tivesse colocado uma arma na minha cabeça, mas porque eu mesma tinha complexado com aquilo e acho que não estou isolada. Quando penso em centenas de meninas chegando no seu primeiro dia de aula numa sala abarrotada de homens, o quão com medo e aterrorizada elas ficam.

Felizmente nessa época eu ainda era muito jovem (tinha só 11 ou 12 anos!) e ainda teria várias oportunidades de entrar na STEM, o que não acontece com muitas mulheres que só vão sentir este impacto na graduação, onde já não há mais tempo de ter oportunidades de reentrar na área.

No ensino médio, resolvi fazer ensino técnico e já fui um pouco mais preparada para ser a única menina da classe. Meu pai tinha me dito “Você vai para escola técnica, só tem nerds e poucas garotas lá”, eu pensei “Que besteira, meu pai deve estar brincando, esses esteriótipos são tão ultrapassados” (Mas mesmo assim fiquei pensando na possibilidade).

Ao chegar na escola, no primeiro dia uma mulher nos disse “Os alunos de informática me sigam” e ao seguir não conseguia ver outra menina naquela multidão. Ao sentar na classe, uma das minhas colegas me disse “parece que somos minoria por aqui” e de fato, éramos!

No primeiro ano éramos 7 garotas e 33 garotos na nossa classe. Foi sim bastante impactante começar a estudar naquela classe com tantos garotos, era ruim quando eles resolviam ignorar que garotas existiam na classe e ficavam falando besteira, mas com o tempo me acostumei.

Apesar de ter boas notas em disciplinas como programação, pensei em desistir da TI muitas vezes (e acredito que não foi só eu, sou a única menina da minha turma que está no momento fazendo um curso superior da área de TI), a sensação de autossabotagem era grande.

Science Camp - elas na ciência. Primeiro programa de empoderamento de meninas na ciência que participei.

Quando estava do segundo para o terceiro ano do ensino médio, tive a oportunidade de participar em um programa da embaixada dos EUA que infelizmente só aconteceu uma vez. O chamado "Science Camp – elas na ciência" era destinado a empoderar garotas na ciência e aquilo foi o começo da desconstrução de vários complexos que tinha comigo mesma, passei a ser mais confiante e a acreditar mais que poderia fazer Ciência da Computação.

Depois eu participei de vários outros programas e conheci muitas outras mulheres incríveis, nesse outro post do meu blog falo mais sobre outros programas que participei sobre garotas e computação.

Atualmente faço Ciência da Computação, trabalho num laboratório onde sou a única menina da sala, vou para turmas onde sou a única garota. Já me sinto mais confortável apesar de, às vezes, ainda me sentir um pouco insegura, algumas pessoas (vez por outra) tentam sabotar a minha segurança confundindo com ser “metida”.

O que quero concluir com isto tudo é que o meu maior inimigo como uma garota na TI e como uma garota nas STEM não eram os homens (sim, ouço às vezes comentários idiotas de pessoas idiotas, desde “meninas não são boas em programação” até “meninas não deveriam ter saído da cozinha”), mas o meu maior problema eram os meus próprios complexos, a maneira como me sentia inferior aos meninos das minhas classes.

Apesar de que, os comentários ruins e até algum tipo de assédio físico ajudassem, em algum momento, a me sentir inferior. Mas, o meu maior inimigo era eu mesma, a minha cabeça.

Por isso, acho que é importante dizer para as meninas que elas são boas sim, que elas podem ser cientistas. Estes programas são muito importantes! =)

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